BRASIL; Sociedade e cultura coloniais

De Dicionário de História Cultural de la Iglesía en América Latina
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Condições indígenas anteriores

Quando da chegada dos primeiros portugueses,[1]o Brasil possuía em torno de um milhão e cem mil habitantes,[2]que viviam espalhados por todo o território, principalmente nas margens do litoral.[3]Estes eram de uma grande diversidade de nações e línguas, mas em geral possuíam costumes semelhantes.

A formação societária consistia no tipo tribal, onde a comunidade era regida por um ou mais chefes que ditavam as normas locais, e estes por sua vez eram encarregados de todas as funções de organização da tribo. A forma de vida destas comunidades era muito simples, viviam em grandes casas formadas de palmas, em que habitavam em torno de cinqüenta homens casados com suas mulheres e filhos,[4]e dormiam em redes de pano.

A base alimentar era a agricultura,[5]a caça e a pesca. Aos homens cabia o dever de caçar e pescar, as mulheres eram responsáveis pela agricultura e pelo dever do cuidado dos filhos, sendo inteiramente responsável pela educação nos primeiros anos.[6]Não cultuavam nenhum deus em particular, temiam apenas o demônio, e respeitavam apenas ao trovão ao qual chamavam de Tupã e o tinham como um espírito divino.[7]

O tipo de união era bigâmica, na qual o índio, de acordo com a sua capacidade guerreira ou de conquista, lhe era permitido diversas mulheres. Ao índio lhe bastava à vida simples, a sua liberdade, e uma produção de subsistência. Não conheciam as leis humanas, não sabiam o que era a cultura, a arte, a Igreja, os oradores e pregadores. Não tinham conhecimento da existência de uma forma de vida além da sua.

O som da música era aquela proveniente do canto dos pássaros, os rumores aqueles advindos dos mares ou do sopro do mar. O ódio, somente aquele produzido pelas tribos inimigas. O guerrear fazia parte da cultura indígena, as diferentes nações se combatiam com o objetivo de manter sua honra e proteger-se, com isto, costumeiramente, capturavam seus inimigos e os transformavam em prisioneiros de guerra.

Estes ficavam sob os cuidados da tribo, por um tempo que variava de cinco a seis meses, e depois eram devorados pelos opositores em um ato de canibalismo[8], o que causou grande terror aos portugueses que desembarcavam na terra. Das guerras emergiam os grandes combatentes, e estes gozavam da fama entre suas comunidades.

O matrimônio nas comunidades indígenas, em geral, era realizado entre parentes, e com isto se mantinha a raiz tribal. Mas não se impendia a realização de uma união matrimonial através de índios de diferentes tribos com o aval da comunidade. Segundo as tradições, o noivo era obrigado a prestar serviços à família da noiva, antes e depois do matrimônio, e passava a viver como um dependente do grupo doméstico do sogro.[9]

Os laços familiares eram muito importantes para uma comunidade indígena. Caso um parente passasse por algum tipo de dificuldade, era imediatamente socorrido pelos outros, a eles era insuportável ter a consciência de que algum da sua própria família sofria. Desta forma, o senso de solidariedade era muito forte dentro das ramificações. A morte de um ente da família era muito lamentada, e para o indígena a alma seria transportada para um campo, onde havia um rio e as almas não faziam outra coisa a não ser se entregar às danças.[10]

Quando do desembarque dos portugueses no século XVI, calcula-se que existiam em torno de trezentos e quarenta línguas diferentes, agrupadas em três famílias linguísticas: o Tupi-Guarani, Aruaque e Caribe. O Tupi-Guarani, após o descobrimento, se tornou a língua difundida no meio português,[11]principalmente pela elaboração de uma gramática pelos padres jesuítas.[12]

No que se refere à arte, os índios, mestres por excelência da arte natural, utilizavam uma variada linha de materiais que a natureza lhes oferecia para desafiar a sua própria habilidade manual e sua criação. Este tipo de arte foi muito difusa em materiais de utensílio do próprio índio, seja nos materiais de caça, nos utensílios de casa, ou nas mais variadas formas de utilidades.

Utilizavam dos mais diversos materiais para moldar a sua arte, materiais estes que encontravam no seu próprio habitat natural, como as lascas de pedra para cortar, facas de osso, etc. Com estes materiais podia o índio dar forma a sua imaginação. Estas obras eram típicas de sociedades tribais e havia uma personificação em cada objeto que produziam.

No que se refere às artes plásticas, os indígenas a desenvolviam através da arte plumária ou a pintura realizada em seus próprios corpos, na cerâmica ou nos trançados de suas peneiras, cestos e outros objetos. Procuravam combinar da forma mais elementar possível a estética e o gênero artístico, explorando a sua habilidade para as diversas combinações, como o trançado geométrico, a intercalação de telas, e tantos outros produtos e desenhos que tomavam conta da habilidade indígena. Todo o trabalho artístico era executado com grande paciência e zelo. Para isto utilizavam múltiplas técnicas e se concentravam no interesse que lhe movia para a construção do objeto.

Neste contexto cultural, chegavam os portugueses advindos da plena revolução cultural que o renascimento havia levado as suas nações, traziam na sua bagagem a cultura e a sede de gerar riqueza na nova terra. Com eles advinha uma forma de organização social já impressa na Europa quinhentista, com seus critérios e posições sociais.

A diversidade de raças e cultura no Brasil Colonial

O choque entre as culturas era inevitável, visto que o colonizador trazia consigo toda uma cultura milenar, recheada de civilização. Em um primeiro momento, a convivência de índios e portugueses se concentrou em um processo de distanciamento, mas aos poucos, a aculturação por parte de alguns portugueses à cultura indígena foi irreversível.

São diversos aqueles que pelo Brasil formaram a sua família, casando-se com uma índia, e deixando para trás aquilo que tinham construído na Europa. Deste cruzamento dos índios com o homem branco, seria formada a raça dos mamelucos ou « brasilíndios».[13]Mas não foram exceção aqueles que preferiram manter a pureza de suas raças e trouxeram para o Brasil suas famílias.

Isto principalmente a aqueles que eram os grandes senhores que viriam a habitar na colônia, a princípio sozinhos, mas com o desenvolvimento comercial da terra trouxeram suas famílias e por aqui firmaram suas moradias. Além deste, devemos recordar o fato de moças órfãs terem sido enviadas à colônia para se esposarem de colonos que aqui viviam, e assim manter a linhagem portuguesa no Brasil colonial.

Com a chegada dos escravos negros advindos da África,[14]um novo grupo se formaria, trazendo consigo a sua cultura, língua e religiosidade. O negro foi portador do seu alto grau de desempenho na agricultura, marcenaria, ferragem, e seria fonte indispensável no desenvolvimento da culinária local.[15]Advindos das mais diversas regiões africanas, falavam os mais diversos idiomas.

Foram espalhadas por todo o território, e passaram a conviver com as mais diversas tribos africanas. No Brasil foram privados de comunicar-se através de sua língua materna,[16]e obrigados ao uso do português como língua oficial, o que se tornava um entrave para a vivência de uma cultura africana em solo brasileiro. Na pronúncia do português, inaugurou um novo tipo de sonoridade à língua portuguesa, o que ainda pode ser verificado em regiões onde a predominância da escravidão foi mais extensiva.

Na sua nova pátria se defrontaram com uma cultura já pré-estabelecida, a luso-tupi, e à qual se aculturariam mais tarde. Apesar deste processo de aculturação, o negro acabou por impor sua cultura,[17]mas reinterpretada dentro de um contexto cultural luso-tupi.[18]

Apesar da aculturação o negro tenta manter algumas de suas marcas culturais como a forma de vestir. Era comum os negros vestidos com trajes do congado maometano colorido. Manteriam os seus talismãs, os fetiches, os cultos e mandingas,[19]que eram usados como forma de proteção contra todo mal e opressão. A sonoridade de cantigas e danças,[20]ainda hoje podem ser evidenciados em cantos do folclore nacional. Na religiosidade, o negro trouxe na bagagem os costumes afros com seus ritos e deuses do candomblé.[21]

Apesar de os negros terem chegado ao Brasil como escravos, foram muitos os que viveram de forma livre, em geral eram os negros alforriados. Viviam nas vilas e trabalhavam das mais diversas formas. As mulheres como quituteiras, os homens no trabalho rural ou mesmo como ferreiros, marceneiros ou serviços gerais. Adquiriam hábitos dos brancos e procuravam viver a vida como a gente da vila, se enquadravam na vida social como os brancos.

O Brasil se tornaria um país de diversas raças,[22]a política portuguesa na colônia não impedia a entrada dos estrangeiros,[23]não havia outra exigência a não ser a do catolicismo. Isso contribuiu de forma contundente para a chegada de diversos povos,[24]como os franceses durante o tempo das invasões no século XVI, os holandeses no século XVII que aqui desembarcavam com seu investimento financeiro movendo os engenhos de açúcar, o judeu mascate,[25]que encontrou na colônia uma terra desprovida de tudo e uma enorme fonte para o seu enriquecimento.

A diversidade de raças e elementos culturais fez com que a cultura do brasileiro fosse construída não de uma predominância europeia, como era de se esperar em detrimento de uma colonização portuguesa, mas se formou baseada na diversidade das culturas que predominaram no tempo colonial. Assim, a cultura brasileira é fruto de um intercâmbio de formas culturais diversas.[26]

Urbanização

A sociedade colonial era basicamente constituída de ricos senhores de engenho,[27]detentores de todo o poder colonial e que em muito lembrava os senhores feudais da idade média; dos escravos, que constituíam a maior parte da população colonial, e que eram os verdadeiros produtores diretos da economia local, considerados débeis, mas que serviam para a fortificação e constituição da classe senhorial colonial,[28]e os colonos que, advindos das mais diversas regiões, constituíam no Brasil suas famílias.

No que se refere às cidades brasileiras nos séculos XVI e XVII, eram munidas de pequenas construções,[29]edificadas com materiais próprios da terra, como o barro, a madeira e a pedra.[30]As cidades, em geral, possuíam poucos habitantes, e a maioria viviam na zona rural. As grandes propriedades rurais se estabeleciam como o símbolo do domínio e poder dos senhores de engenho.[31]

Mais tarde, na metade do século XVII a expansão da aristocracia brasileira geraria a urbanização na colônia, símbolo do poder da classe. As cidades costeiras que anteriormente possuíam um aspecto rústico das aldeias ganhavam agora aspecto civilizatório, a arquitetura local se assemelhava às cidades portuguesas medievais. As montanhas e o traçado natural da região não foram entraves para a expansão urbana,[32]que seguiam assim o curso da natureza com uma arquitetura predominantemente luso-brasileira.[33]

NOTAS

  1. De forma geral os portugueses que vieram para o Brasil durante o tempo colonial podem ser classificados em cinco grupos principais: a) Fidalgos e militares, que constituíam a classe mais elevada e que tiveram a total predileção na concessão de terras; b) Sacerdotes, aqueles que vieram para instituir a religiosidade e moral, principalmente os pertencentes a ordens religiosas, sobretudo os jesuítas; c) Degredados, aqueles que foram condenados na metrópole por crimes, principalmente de amor, eram enviados para a colônia como forma de punição; d) criminosos que fugiam para o Brasil procurando escapar de suas penas; e) homens bons, lavradores, artífices, artesãos, considerados os verdadeiros colonizadores. M. DIEGUES JUNIOR, Etnias e culturas, 77.
  2. J. C. MELATTI, Índios do Brasil, São Paulo, 44.
  3. A localização de uma tribo poderia mudar de tempos em tempos, tudo dependia: da condição do solo para a plantação, a localização de água, lenha e local seguro contra a invasão de outras tribos. Com a constante cultivação em um determinado local este perdia a produtividade e desta forma havia a necessidade de se deslocar para outra terra.
  4. Em geral uma comunidade indígena era composta de quatro a sete habitações, dispostas de modo a deixar uma área quadrangular central livre que era utilizada para as celebrações diversas. S. B. HOLANDA, História Geral da civilização brasileira, 73.
  5. Na agricultura os homens eram encarregados da limpeza do terreno, para que depois as mulheres pudessem plantar. Os produtos cultivados eram: a mandioca, principal produto de uma comunidade indígena, o feijão e o milho. Na pesca os homens levavam para casa o pescado e marisco. A carne animal era a mais variada, de acordo com a caça proferida.
  6. O frade capucinho Frances, Yves d’Evreux, na obra «Suitte de L’Histoire des choses plus memorables advenues em Maragnam», especifica no ano de 1613 a cultura do desenvolvimento humano dos índios nas diversas etapas da vida. Segundo ele, o índio vivia as diversas etapas da vida seguindo uma ordem já preestabelecida pela comunidade. Nos primeiros anos a criança se alimenta com o leite da mãe e com farinha; em uma segunda etapa começa a caminhar e chamava-se esta fase de “Kounoumy miry”, fase que vai até os sete anos da criança; Na fase intermediária, ainda sobre a proteção e cuidados da mãe, a criança come alimentos sólidos e começa a aprender a arte da caça, com arco e flecha construídos especialmente para ele. Desde pequeno lhes era ensinado o respeito aos mais velhos; A terceira fase é o tempo da adolescência, o rapaz não fica mais sobre a proteção da mãe, agora o pai é o responsável pelo seu desenvolvimento. Neste momento é obrigado a caçar e ajudar no sustento da família, esta fase recebe o nome de “Koynoumi ouassou”, e vai da idade de quinze aos vinte e cinco anos. Torna-se hábil na caça e na pesca. Caso morram nesta idade é grande a dor dos pais e o chamam de “o grande rapaz morto”; Na etapa sucessiva, que vai dos vinte e cinco aos quarenta é o tempo denominado “Aua”, é o tempo viril e apresenta o homem forte e corajoso. É pronto para a guerra e para encontrar uma mulher para o casamento; A última fase vai dos quarenta anos até a morte e era chamado de “Thouyuae”, ou seja, ancião. É respeitado por todos, e sua voz na comunidade é ouvida com grande importância. Y. D’EVREUX, Idade e Ritos Selvagens, in D. RIBEIRO - MOREIRA NETTO, A fundação do Brasil, 151-157.
  7. Em uma definição para esta divinização do fenômeno natural «[...] temos que poderia ser simplesmente motivado pelos males, não imaginários, das tempestades e raios, que fendiam as árvores da floresta, ou poderia ser medo, que envolvesse já a ideia dum ser Superior ao homem, motor desses trovões: medo de “Aquele que troveja”. Para Anchieta, os Índios não adoravam criatura nenhuma, “somente os trovões cuidam que são Deus”. Se esta identificação fosse rigorosa, seria uma forma idolátrica. Não devia, porém, existir tal identificação, que implica já conhecimento da ideia de Deus, e os Índios, diz Cardim, não tem nome próprio com que expliquem a Deus [...] Quando os Padres inquiriam sobre a existência dum Ente Supremo, eles respondiam no mesmo sentido: “Tupane é o que faz os trovões e relâmpagos e que este é o que lhes deu as enxadas e mantimentos e, por não terem outro nome mais próprio e natural, chamam a Deus Tupã”» (S. LEITE, História da Companhia de Jesus no Brasil, II, 17).
  8. Para o indígena o ato do canibalismo não se resumia somente no alimentar-se da carne humana do inimigo, mas representava a absorção da força inimiga, ou seja, da capacidade e habilidade de combater do outro. Este ato era precedido de um ritual que durava em torno de cinco dias, e que era acompanhado de dança. Neste ritual eram convidados os parentes de outras localidades. A guerra entre eles simbolizava a vingança ou a posição de superioridade da tribo.
  9. S. B. DE HOLANDA, Caminhos e fronteiras, 70.
  10. F. CARDIM, Tratados da terra, 87.
  11. Era comum em todo o território a presença da língua francesa, portuguesa e espanhola, que depois miscigenaram com a língua indígena e adotaram seus costumes, principalmente aqueles do tronco tupi. L. M. E SOUZA, História da vida privada no Brasil, 335.
  12. Das tribos encontradas pelos portugueses, as principais foram: Tupinambás e Tupiniquins na faixa que estende pelo Maranhão; Caetés e Tabajaras, na região pernambucana; Potiguaras que se estende na área litorânea nordestina (Ceará e Rio Grande do Norte); dos Taramambé que se situavam mais no litoral paraense; dos Tamoios, no litoral de São Vicente e Rio de Janeiro; dos Tupis e dos Guaranis, presentes ao sul; dos Tupinas e Amoipiras no interior do nordeste. M. DIEGUES JUNIOR, Etnias, 52.
  13. A vida do brasilindio ou mameluco foi assim resumido por Darcy Ribeiro: «Os brasilindios ou mamelucos paulistas foram vitimas de duas rejeições drásticas. A dos pais, com quem queriam identificar-se, mas que os viam como impuros filhos da terra aproveitavam bem seu trabalho enquanto meninos e rapazes e, depois, os integravam as suas bandeiras, onde muitos deles fizeram carreira. A segunda rejeição era a do gentio materno. Na concepção dos índios, a mulher é um simples saco em que o macho deposita sua semente. Quem nasce é o filho do pai, e não da mãe, assim visto pelos índios. Não podendo identificar-se com uns nem com outros de seus ancestrais, que o rejeitavam, o mameluco caia numa terra de ninguém, a partir da qual constrói sua identidade do brasileiro» (D. RIBEIRO, O povo brasileiro, 97).
  14. A princípio os sociólogos admitiam somente a exclusividade da presença dos negros de cultura banta no Brasil que perdurou por muitos anos. Posteriormente, segundo verificação de Nina Rodrigues, se passou a acreditar na presença de outra cultura exclusiva, que seria o sudanês. A partir das pesquisas de Arthur Ramos, se passou a dividir a presença cultural negra no Brasil com base em três grupos distintos: Os sudaneses, Cuineano-Sudanesas islamizadas e os de culturas Bantas (provenientes de Angola e Contra-Costa). M. DIEGUES JUNIOR, Etnias e culturas no Brasil, 88-89.
  15. A função das negras que trabalhavam na cozinha da casa grande introduziram no cardápio familiar alguns dos costumes das receitas típicas africanas, como o uso da pimenta e do dendê, além de diversos outros tipos de condimentos. Dentre os pratos temos o camarão seco, a galinha d’angola, o quiabo. Também adaptaram ao tempero africano alguns pratos típicos portugueses como as moquecas e fritadas. R. ALMEIDA, Vivência e projeção do folclore, 111.
  16. Aos negros africanos foi-lhes imposto o ato da comunicação através do português como língua oficial, e muitos dos senhores de engenhos evitavam manter em suas senzalas negros que fossem provenientes de uma mesma região. «[...] Os negros originavam-se principalmente da costa ocidental da África [...] Entre tais grupos haviam centenas de dialetos. Diversos na língua e na cultura, os negros traziam da África hostilidades recíprocas [...]» (L. M. SOUZA, Inferno Atlântico, 341).
  17. «O negro trouxe uma nota alegre ao lado do português taciturno e do índio sorumbático. As suas danças lascivas, toleradas a princípio, tornaram-se instituição nacional; suas feitiçarias e crenças propagaram-se fora das senzalas. As mulatas encontraram apreciadores de seus desgarres e foram verdadeiras rainhas. O Brasil é o inferno dos negros, purgatório dos brancos, paraíso dos mulatos [...]» (C. ABREU, Capítulos de história colonial, 47).
  18. Apesar da proibição os negros conseguiram manter traços de sua cultura, que lhes era permitido como forma de manter sob ordem a senzala e como liberação de seus sofrimentos, a eles era permitido a cada oito dias a sua manifestação cultural «[...] como as atividades lúdicas que persistiram nos cultos africanos, no batuque, no samba, nas danças religiosas e de capoeira; com certos mitos, contos, provérbios ou elementos da organização clãnica […]» (R. RENE, cultos afro brasileiros do Recife, 26).
  19. Nos cultos negros temos a inserção dos terreiros de macumba, candomblés, xangô e batuques dos filhos de santo.
  20. «A condição de escravo impedia o negro, na América, de realizar todos esses deveres com suas deidades, não lhe dava tempo nem meios, nem sentia necessidade de ser protegido no trabalho, que lhe transformou a vida em inferno. Mas, as raízes profundas da alma, as crenças, as tendências, substrato inconsciente, não abandonam o homem, podem transformar-se, procurar desvios, recalcar-se, sem desaparecer jamais» (R. ALMEIDA, Vivência e projeção do folclore, 117).
  21. «O culto je-nago, o que se impôs aos negros da Bahia, é baseado num sistema cosmolátrico onde cada divindade ou orixá preside um elemento da natureza: Xangô, por exemplo, é o deus do trovão; Iemanjá, a deusa das águas; Oxossi, o deus das matas. Este tipo de idolatria inserida na cultura nacional através dos negros escravos sudaneses. Daqueles advindos das regiões do rio do Congo e da África oriental, do Moçambique, ou chamados bantu, [...] a sua religião baseava-se mais no culto dos espíritos dos antepassados. Em todas as práticas religiosas africanas a música e, sobretudo, o ritmo marcado fortemente pelos tambores sagrados, os atabaques, é fundamental. Soa os ritmos dos atabaques que fazem baixar os santos ou orixás, que provocam de transe nas filhas e filhos-de-santo. Cada orixá tem a sua batida especial do atabaque e o seu estilo de dança» (O. BEOZZO, Situação do negro na sociedade brasileira, in Revista eclesiástica brasileira, 43, [171,1983] 570).
  22. O cruzamento entre as diversas raças no Brasil geraram novas raças que se classificam em: o cruzamento do branco com o negro gerou o mulato; do branco com o branco, o branco; do branco com o índio, o mameluco ou brasilíndio; do negro com o negro, o crioulo; do negro com o índio, o cafuzo; do negro com o mulato, o cabra; o índio com o índio, caboclo; e o pardo, classificado como cruzamento secundário entre mulato com mulato, criolo com crioulo, mulato com mameluco, estes com nítida pigmentação morena tendendo a cor mais escura. M. DIEGUES Junior, Etnias e culturas, 101.
  23. «[...] Durante quase todo o século XVI a colônia esteve escancarada a estrangeiros, só importando as autoridades coloniais que fossem de fé ou religião católica [....] continua em uma avaliação do historiador Handelmann, [...] ainda não se opunha todavia [...] restrição alguma no que diz respeito a nacionalidade: assim é que católicos estrangeiros podiam emigrar para o Brasil e ai estabelecer-se» (G. FREYRE, Casa grande e senzala, 93).
  24. Esta abertura da colônia aos diversos povos trouxe a colônia uma cultura de acolhida, da fraternidade, sem uma diferenciação de língua ou raças. «De todos os traços distintivos do brasileiro, talvez um dos mais gerais e constantes, que constitui a sua força e a sua fraqueza a um tempo, o mais atraente e comunicativo, e que mais o destaca, nos primeiros contatos, e mais se acentua no convívio, é, pois, a sua bondade que parece brotar da alma do povo, do seu temperamento natural. A sensibilidade as ofensas recebidas, um certo pudor em manifestar os seus egoísmos a ausência de qualquer orgulho de raça, a repugnância pelas soluções radicais, a tolerância, a hospitalidade, a largueza e a generosidade no acolhimento, são outras tantas manifestações desse elemento afetivo, tão fortemente marcado no caráter nacional [...]» (F. AZEVEDO, A cultura brasileira, 214).
  25. A entrada se deu em maior número durante o século XVII, alguns fatos contribuíram para que isto acontecesse, como: a expansão açucareira e da colônia, a presença dos holandeses no nordeste e a ausência do Santo Oficio na região. O comércio mascate rural e urbano esteve basicamente em suas mãos. Muitos destes que pelo Brasil fincaram moradia enriqueceram e mais tarde tornaram-se senhores de engenho (M. DIEGUES JUNIOR, Etnias e culturas, 44-45).
  26. F. AZEVEDO, A cultura brasileira, 210-211.
  27. «[…] Diante deles se curvavam, submissos, o clero e regia a ordem econômica, política, religiosa e moral. Nesse sentido, constituía uma oligarquia que operava com a cúpula patronal da estrutura de poder da sociedade colonial. Frente a ela, são a camada parasitaria de armadores e comerciantes exportadores de açúcar e importadores de escravos -que era também quem financiava os senhores de engenho- guardava certa precedência. Mas não dava lugar a antagonismos, porque suas disputas eram menos relevantes que sua complementaridade» (D. RIBEIRO,O povo brasileiro, 258).
  28. D. FREITAS, Escravos e senhores de escravos, 123.
  29. Na primeira obra que relata a história do Brasil, Pedro Gandavo em 1576 descreve o desenvolvimento e melhoria das primeiras habitações, relata: «[...] Porque no princípio não havia outras na terra senão as de taipa e térreas, cobertas somente com palma. E agora já há muitas assobradadas, de pedra e cal, telhadas e forradas como as deste Reino, das quais as ruas mui compridas e formosas na maioria das povoações de que fiz menção. E assim (segundo a gente vai crescendo) espera-se que em breve tempo haja outros muitos edifícios e templos mui suntuosos, de maneira que nesta parte da terra acabe de se enobrecer [...]» (P. M. GANDAVO, A primeira história do Brasil, 73).
  30. L. M. E SOUZA, Inferno Atlântico, 91.
  31. Na zona rural habitavam os grandes senhores de engenho, os grandes latifundiários do período colonial. Já as cidades eram habitadas pelos trabalhadores, como os funcionários da administração, oficiais mecânico e mercadores gerais. Estes últimos, em geral, consistia-se em judeus ou cristãos novos que vinham para o Brasil como mercadores, faziam aqui riqueza com seus produtos provenientes da metrópole e acabavam por se instalar na colônia.
  32. «[...] a morada portuguesa mais fiel à arquitetura portuguesa, pelo menos na aparência, embora não descartasse as influências indígenas e as adaptações dos colonos quanto ao modo de morar [...]» (L. M. E SOUZA, Inferno Atlântico, 91).
  33. L. R. M. CENTURIÃO, A cidade colonial no Brasil, 217.

BIBLIOGRAFÍA

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ROBSON FERNANDO CORRÊA LEITE